ATA DA PRIMEIRA SESSÃO SOLENE DA QUARTA SESSÃO LEGISLATIVA ORDINÁRIA DA DÉCIMA SEGUNDA LEGISLATURA, EM 17-02-2000.

 


Aos dezessete dias do mês de fevereiro do ano dois mil reuniu-se, no Plenário Otávio Rocha do Palácio Aloísio Filho, a Câmara Municipal de Porto Alegre. Às dezessete horas e trinta e cinco minutos, constatada a existência de “quorum”, o Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos da presente Sessão, destinada a homenagear os cem anos da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, nos termos do Requerimento nº 06/2000 (Processo nº 115/2000), da Mesa Diretora. Compuseram a MESA: o Vereador João Motta, Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre; o Senhor Pedro Ruas, Secretário Estadual de Obras Públicas e Saneamento, representando o Governador do Estado do Rio Grande do Sul; o Deputado Estadual Vieira da Cunha, representando a Assembléia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul; o Ministro Aldo Fagundes, representando o Superior Tribunal Militar; a Doutora Wrana Maria Panizzi, Magnífica Reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; o Doutor Eduardo Kroeff Machado Carrion, Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; o Desembargador Délio Spalding de Almeida Wedy, representando o Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul; o Doutor Fábio Bitencourt da Rosa, Juiz Presidente do Tribunal Regional Federal - 4ª Região; o Coronel João Vanderlan Rodrigues Vieira, Presidente do Tribunal Militar; o Coronel Irani Siqueira, representante do Comando Militar do Sul; o Doutor Nivaldo Soares, representante do Ministro dos Transportes; o Doutor José Francelino de Araújo, Presidente do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul; o Professor Mainar Longhi, representante da Reitoria da Pontifícia Universidade Católica; o Tenente-Coronel Itamar dos Santos Castro, representante do Comando Geral da Brigada Militar; o Vereador Nereu D'Avila, 1º Secretário deste Legislativo. Ainda, como extensão da Mesa, foram registradas as presenças do Professor Plínio de Oliveira Corrêa, Vice-Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Coordenador Geral das Festividades do Centenário; da Senhora Zita Possamai, representante da Secretaria Municipal de Cultura; dos Professores Carlos Silveira Noronha e Isolda Paes. A seguir, o Senhor Presidente convidou a todos para, em pé, ouvirem a execução do Hino Nacional e, após, concedeu a palavra aos Vereadores que falariam em nome da Casa. O Vereador Nereu D'Ávila, em nome da Mesa Diretora, discorreu sobre a fundação da Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre, há cem anos, destacando sua importância para o Estado e lembrando nomes representativos da história brasileira que integraram a faculdade hoje homenageada. O Vereador Décio Schauren, em nome da Bancada do PT, afirmando que "a história é testemunha da grandeza da contribuição da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul para o crescimento sociojurídico nos últimos cem anos", parabenizou a direção dessa faculdade pela qualidade educacional ali atingida. O Vereador Elói Guimarães, em nome da Bancada do PTB, salientou a política educacional que marca a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, declarando que essa instituição busca não apenas formar profissionais, mas também criar uma visão humanista, voltada para a realidade na qual se encontra inserida. O Vereador Lauro Hagemann, em nome da Bancada do PPS, analisou o papel do ensino no mundo contemporâneo, ressaltando a participação social ativa sempre observada na atuação da faculdade hoje homenageada e propugnando pela continuidade desse papel de debate e construção da história brasileira. O Vereador Isaac Ainhorn, em nome da Bancada do PDT, relembrou a época em que foi aluno da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, destacando a natureza democrática, pública e universal do ensino ali ministrado, o qual viabiliza o acesso à educação superior aos mais diferentes grupos sociais. Na ocasião, o Senhor Presidente informou que a Doutora Wrana Maria Panizzi teria que se ausentar da presente solenidade, a fim de atender a compromissos da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sendo substituída pelo Doutor Newton Rodrigues Paim. O Vereador Pedro Américo Leal, em nome da Bancada do PPB, saudou os integrantes da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, atentando para a profunda integração existente entre essa instituição e a comunidade porto-alegrense. O Vereador Reginaldo Pujol, em nome da Bancada do PFL, parabenizou a instituição homenageada, assinalando o trabalho por ela realizado em prol do desenvolvimento da educação, da cultura e, principalmente, da formação política da comunidade gaúcha. A seguir, o Senhor Presidente concedeu a palavra aos Senhores Eduardo Kroeff Machado Carrion e Newton Rodrigues Paim que, em nome da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e da Doutora Wrana Maria Panizzi, agradeceram a homenagem prestada pela Casa. Após, o Senhor Presidente convidou os presentes para, em pé, ouvirem a execução do Hino Rio-Grandense, agradeceu a presença de todos e, nada mais havendo a tratar, declarou encerrados os trabalhos às dezenove horas e trinta e cinco minutos, convocando os Senhores Vereadores para a Sessão Ordinária de amanhã, à hora regimental. Os trabalhos foram presididos pelo Vereador João Motta e secretariados pelo Vereador Nereu D'Avila. Do que eu, Nereu D'Avila, 1º Secretário, determinei fosse lavrada a presente Ata que, após distribuída em avulsos e aprovada, será assinada por mim e pelo Senhor Presidente.

 

 


O SR. PRESIDENTE (João Motta): Estão abertos os trabalhos da presente Sessão Solene, destinada a homenagear os 100 anos da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Convidamos para compor a Mesa: o representante do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, Secretário das Obras Públicas e Saneamento, Sr. Pedro Ruas; a Magnífica Reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Dra. Wrana Panizzi; o ilustre Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Prof. Dr. Eduardo Kroeff Machado Carrion; o nosso sempre Vereador, Dep. Vieira da Cunha, representante da Assembléia Legislativa do Estado; o representante do Tribunal de Justiça do Estado, Des. Délio Spalding de Almeida Wedy - 3º Vice-Presidente; o representante do Superior Tribunal Militar, Ministro Aldo Fagundes; o Dr. Juiz Presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Dr. Fábio Bitencourt da Rosa; o representante do Comando Militar do Sul, Coronel Irani Siqueira; o representante do Ministro dos Transportes, Dr. Nivaldo Soares; o Presidente do Instituto dos Advogados do Rio Grande do Sul, Dr. José Francelino de Araújo; o representante do Sr. Reitor da PUC, Prof. Mainar Longhi, e o representante do Comando Geral da Brigada Militar, Tenente-Coronel Itamar dos Santos Castro.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Nacional.

 

 (Executa-se o Hino Nacional.)

 

O Ver. Nereu D’Avila está com a palavra e falará em nome da Mesa Diretora.

 

O SR. NEREU D’AVILA: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Hoje é um dia de festa para o Rio Grande. Em 17 de fevereiro de 1900, exatamente há cem anos, fundava-se a Faculdade Livre de Direito de Porto Alegre. A homenagem da imprensa tem sido bastante farta. Os maiores jornais deste Estado festejaram esses cem anos com cadernos especiais. A Ordem dos Advogados e o Poder Judiciário homenagearam a passagem desses cem anos, e também a sociedade gaúcha, pelos seus representantes na Assembléia, no Poder Judiciário, na mídia e neste Legislativo, que é a Casa do Povo de Porto Alegre. Hoje, às 8h30min, o primeiro e velho sino fundador foi reinaugurado para orgulho da Faculdade.

Reportava-me, diante de tantas informações históricas e lembrando das personalidades que por lá passaram durante esses cem anos, que são exatamente seis mil, setecentos e trinta e cinco bacharéis. Eu sou um deles, assim como o Ver. Elói Guimarães, o Ver. Isaac Ainhorn, o Brochado da Rocha, que está aqui, o ilustre Diretor Eduardo Machado Carrion, o ilustre Vice-Diretor, meu colega de turma, Plínio de Oliveira Corrêa, e o ilustre Dr. Noronha, nosso colega de turma. Fazemos parte desses seis mil, setecentos e trinta e cinco bacharéis em Direito. Perguntava-me o que poderíamos acrescentar, depois de tantas informações, a respeito da história, da importância de tudo o que já foi escrito pelo Dr. Paulo Brossard, pelo Dr. Alberto André, que também fez brilhante artigo, enfim, personalidades, a partir do Diretor, que escreveram nos jornais e nas revistas tudo a respeito da Faculdade de Direito. Eu penso que poderíamos acrescentar, talvez repetitivamente, mas em nossa concepção é importante, a sua contribuição às letras jurídicas, sobre o que já foi falado e exultado. Mas o que poderíamos destacar como núcleo, como motor da nossa homenagem desta Câmara, pelo menos da minha parte? Analisando, estudando, cheguei à seguinte conclusão: o fato de por uma faculdade, em cem anos, terem passado dois presidentes da República - Getúlio Vargas e João Goulart -, cinco governadores de Estado - o próprio Dr. Getúlio Vargas, Cilon Rosa, Walter Jobim, Amaral de Souza e Alceu Collares -, seis ministros do Supremo Tribunal Federal e tantas outras personalidades do corpo docente e discente me ensejou que a Faculdade Livre de Direito de 1900, a Faculdade Livre de Direito de 1910 - quando se instalou na Av. João Pessoa, seu endereço histórico, patrimônio histórico desta Cidade - e, finalmente, a partir de 1950, a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul construiu e mudou a história do Brasil. Esse é o ponto fulcral a que eu, neste momento, me reporto. Transformou, alterou a história do Brasil, porque quatro de seus ex-alunos (Getúlio Vargas, Maurício Cardoso - aluno laureado -, João Neves da Fontoura e Paim Filho) ajudaram, e Getúlio Vargas, João Neves e Maurício lideraram a Revolução de 1930, que foi o primeiro marco de alteração da história do Brasil, tanto que o Brasil era um antes de 1930 e é outro depois de 1930. A grande contribuição da Faculdade de Direito foi que ela mudou a história do Brasil através de suas personalidades. E mais: através do próprio João Goulart, como Presidente da República, fez outro capítulo da transformação de um parlamentarismo mitigado para um presidencialismo, com o plebiscito de 6 de janeiro de 1963.

Então, aqui, na Av. João Pessoa, num prédio feito copiando a beleza do Palácio de Verão do Imperador da Alemanha, Kaiser Guilherme II, ali, naquele endereço em que nós também passamos cinco anos, dali se alterou, mudou-se a própria história da nacionalidade pela atitude dos homens que ali se preparavam. Aí vem o segundo ponto: pelos pronunciamentos do próprio Getúlio, que era também um literato, nos seus discursos viu-se que a Faculdade não apenas reproduzia ensinamentos jurídicos, senão, também, ensinamentos humanísticos de tal monta que conseguiu plasmar estadistas do nível dos que eu já citei. Professores já não falo e não vou abordar, porque outros abordarão, ou a questão jurídica propriamente dita. Essa foi, sem dúvida, a maior contribuição da Faculdade Livre de Direito do início do século e hoje a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Para citar o maior vulto - esse que, com ele, com a sua geração, com a sua concepção, inclusive com o seu segundo governo, que também se adaptou a uma visão de que se deveria preservar o patrimônio nacional, a partir da sua eleição de 50 -, Getúlio Vargas, ele aprendeu ali aquilo que viria a aplicar em 30, em 34, quando foi eleito Presidente Constitucional do Brasil, em 37, quando, por concepções históricas, foi obrigado a estabelecer o Estado Novo, e depois, em 50, quando, nos braços do povo, por maioria esmagadora, voltou ao Palácio do Catete pelo voto universal do povo brasileiro.

Quem lê os seus discursos? O nosso companheiro João Luiz Vargas, quando Presidente da Assembléia, mandou confeccionar discursos de grandes personalidades, e ontem à noite me detinha nos discursos e na trajetória de Getúlio Vargas, em toda a sua estada, inclusive, na Assembléia Provincial do Rio Grande. Impressionou-me, sobremodo, já em 1906, ele, que foi da turma de 1907. Em 1906, em 15 de agosto de 1906, os estudantes ficaram revoltados com Borges de Medeiros, que presidia o Estado, porque este Estado foi visitado por um mineiro e presidente eleito do Brasil, Afonso Pena, e foi recebido por Borges de Medeiros e sua comitiva em uma lancha que foi buscá-lo no navio que o trazia ao Rio Grande, e os estudantes da época foram excluídos, principalmente os da Faculdade de Direito, que já possuía uma geração de líderes. Não foram convidados para irem à lancha. Eles ficaram agastados com Borges de Medeiros. Quando Getúlio foi escolhido por seus pares, por todos os estudantes das chamadas academias da época, Getúlio fez um discurso, em 15 de agosto de 1906, saudando Afonso Pena, eleito Presidente da República, não tendo assumido ainda a Presidência, um discurso que só nas páginas de Os Sertões, de Euclides da Cunha, se traça o perfil não só do gaúcho, mas da sua terra, da sua gente, dos seus costumes, do seu passado e do seu futuro.

É impressionante o visionário Getúlio Vargas de 1906 - era quartanista de Direito. É impressionante a sua capacidade literária. Aqueles que achavam que ele era apenas hábil político minimizaram a sua imensa capacidade intelectual, e é só ler aquele discurso de 15 de agosto. Lá pelas tantas, ele, querendo definir o futuro ou a sua visão do início do século - 1906 -, ele disse as seguintes palavras, que são transportadas para hoje, ainda uma realidade, quando já transpusemos o século, e ele estava no início do século. Disse ele: “Quem encarar o progresso humano poderá compará-lo à curva inflexível, em cujos extremos opostos encontram-se polarizadas as duas forças polarizadoras, ambas modificadoras da estrutura e do progresso dos povos: os conservadores e os revolucionários. O conservantismo” - dizia Getúlio em 1906, saudando Afonso Pena - “é uma mola emperrada no funcionamento orgânico. Aos conservadores se pode definir com a frase lapidar de Rui Barbosa: ‘São conchas presas às cristalizações fósseis de um mundo extinto; são inteligências curtas, presas na estreita casamata dos preconceitos, julgando que se pode anquilosar o progresso nas estratificações do passado; ledo engano’.” Assim concluía o parágrafo nesse magistral discurso. Ali, então, plasmado estava o futuro do grande estadista do século, do gaúcho que freqüentou aquelas salas vetustas e seculares, secular agora da Faculdade de Direito de Porto Alegre.

Não posso deixar de parabenizar o Dr. Eduardo Machado Carrion, cujo avô foi também da primeira turma da Faculdade de Direito, e o Dr. Plínio de Oliveira Corrêa, Vice-Diretor da Faculdade. Seria uma injustiça irreparável neste formal epílogo das comemorações dos 100 anos da nossa querida Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

Nos fins de 1998, liderados pelo Sr. Plínio e por delegação do ilustre Diretor Eduardo Carrion, foi executado um organograma de homenagens onde não esqueceram de debater com os estudantes, durante o ano de 1999, em magnífico e inesquecível seminário, todas as questões que foram importantes durante o século na história deste País, principalmente sob o ângulo da sua formação política e constitucional. Por lá passaram ilustres juristas, painelistas, conferencistas, ex-governadores e lideranças políticas de todos os partidos, o que deu, não só para os jovens acadêmicos já do novo século ou, pelo menos, do século que se concluía, mas a todos nós, a visão de que a Faculdade de Direito comemorava os seus cem anos não apenas com reminiscências de saudade tão-somente, mas rememorava, na vivacidade daquilo que foi o apanágio desses anos da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o grande debate das idéias democráticas que ali se forjaram ao longo de muitas e muitas gerações, com as quais nós, palidamente, também aprendemos.

Por isso, levem o Diretor e o Vice-Diretor para todo o corpo docente e para todo o corpo discente a certeza de que V. S.as souberam comemorar esses cem anos à altura e na estatura desses cem anos tão bem vividos. Salvem-na, e permaneça sempre a nossa querida Faculdade aberta, livre, democrática, na multifacetada personalidade de todos os que por ali passaram, forjando sempre, e cada vez mais, o aperfeiçoamento daquilo que é a nossa maior conquista: a liberdade e a democracia. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. Décio Schauren está com a palavra pelo PT.

 

O SR. DÉCIO SCHAUREN: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Tenho a honra de falar pela Bancada do PT nesta Sessão Solene em que celebramos o centenário da Faculdade de Direito, que contribuiu decisivamente para o engrandecimento da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, da qual sou Técnico em Assuntos Educacionais, atualmente licenciado para o exercício da vereança.

Nada melhor para testar a excelência da Faculdade de Direito do que o grande número de ex-alunos seus que ocuparam postos da mais alta relevância no nosso mundo político e jurídico.

A história é testemunha da grandeza da contribuição da Faculdade de Direito da UFRGS para o crescimento sociojurídico nos últimos cem anos. Graças a essas contribuições, mudanças significativas aconteceram desde o início do século, quando o Direito se pautava num padrão privatista, percebendo os conflitos jurídicos como interindividuais. Hoje os conflitos jurídicos são cada vez mais intergrupais, conforme escreve o próprio Diretor da Faculdade, Prof. Eduardo Carrion. Nesse período de cem anos, emerge um Estado intervencionista, que toma iniciativas, que formula políticas, como planejamento econômico, política social e cultural, suplantando o Estado não-intervencionista, também chamado liberal. Há evoluções grandes no Direito de Família nesse período, como o Estatuto da Mulher. Surge o Direito do Trabalho, o Direito Social, envolvendo, por exemplo, o Direito do Consumidor.

O Ver. Nereu D’Avila, a quem quero cumprimentar pela proposição desta Sessão Solene, já fez um histórico exaustivo das contribuições da Faculdade de Direito.

Quero parabenizar a Direção da Faculdade de Direito pela qualidade do ensino de graduação, de pós-graduação e pesquisa que tem atingido. Quero destacar também as atividades de extensão voltadas para a comunidade. Quero, particularmente, lembrar o trabalho do SAJU, que bastante conheci e que prestou relevantes serviços à questão da regularização fundiária no nosso Município através de um convênio entre a Prefeitura e a Universidade Federal. Eu entendo que isso foi muito importante, porque, quando fui presidente da Associação dos Funcionários da UFRGS, juntamente com a Associação dos Docentes, ADUFRGS, nós defendíamos que a Universidade, que as faculdades deveriam sair de dentro dos seus muros e contribuir de forma mais efetiva com a comunidade na qual a Universidade e as faculdades se inserem. Certamente, a Faculdade de Direito tem exercido esse papel. A Faculdade de Direito está diante de muitos novos desafios com as constantes mudanças da sociedade. Nós sabemos que o Diretor, Prof. Eduardo Carrion, está empenhado na tarefa de transformar a Faculdade de Direito num espaço público para o debate e a discussão, de forma pluralista e democrática, aberta e participativa, dos grandes temas nacionais e internacionais.

A Faculdade de Direito cumpre um papel extremamente importante nesse sentido. Sabemos que a Faculdade de Direito, assim como a Universidade Federal do Rio Grande do Sul, vem, nesses últimos anos, enfrentando problemas financeiros sérios devido ao não-repasse de verbas por parte do Governo Federal. Há cinco anos os seus professores e funcionários não têm recebido reajuste salarial. Evidentemente que isso é complicado na concorrência com as universidades privadas. Nós sabemos que isso tudo faz parte de uma estratégia de desmonte da universidade pública por parte de quem vê a educação e a cultura sob a ótica da mercantilização. E a Faculdade de Direito, pela sua tradição, pela sua história, deve contribuir de forma decisiva na luta pela defesa da instituição da universidade pública, até para poder continuar exercendo o seu papel transformador.

Eu quero, com muito prazer, cumprimentar a Direção, os professores, os funcionários e a todos que, de alguma forma, contribuíram para que a Faculdade de Direito da UFRGS chegasse aos cem anos com tamanha tradição e história. Afinal, a celebração de um momento como este é raro. Parabéns a todos! Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Registramos, como extensão da Mesa, as presenças do Coordenador Geral das festividades do centenário, Prof. Plínio de Oliveira Corrêa, Vice-Diretor da Faculdade de Direito da UFRGS; da representante da Secretaria Municipal de Cultura, Sra. Zita Possamai; dos Professores Carlos Silveira Noronha e Isolda Paes. Saudamos também os demais professores e diretores presentes.

O Ver. Elói Guimarães está com a palavra para falar em nome da Bancada do PTB.

 

O SR. ELÓI GUIMARÃES: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Cito, em especial, a Profa. Isolda numa homenagem a um dos lentes que marcaram durante algumas décadas o estudantado, o corpo discente, esposa do eminente Prof. Elpídio Paes. Os demais professores também  sintam-se citados.

Como diziam os vereadores que me antecederam, hoje vive a Cidade - por que não dizer o Estado e por que não dizer o mundo jurídico brasileiro? - um momento extraordinariamente importante para a vida democrática do País, quando a Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul comemora o seu centenário. Cem anos forjando, preparando gerações para os diferentes ofícios, por assim dizer, da sociedade.

A Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul é uma faculdade símbolo, pois as faculdades de Direito não se preocupam com a sua natureza, só com a formação técnica do profissional. Há um componente muito grande da visão humanista. Formam-se profissionais em Ciências Sociais, e a visão da Faculdade de Direito, ao longo da sua trajetória, ao longo do século, foi a de formar profissionais, mas também de dar àqueles profissionais uma visão humanista, uma visão para a realidade do seu meio, para a realidade do seu tempo, para a realidade do seu presente e do seu futuro.

Então, a Câmara Municipal de Porto Alegre, que representa nossa Cidade - e nós aqui falamos não por nós, mas falamos pela Cidade -, está hoje a homenagear o centenário da Faculdade de Direito. Estamos aqui trazendo o agradecimento, a gratidão da Cidade de Porto Alegre e do seu povo à trajetória, à contribuição que a Faculdade de Direito deu ao longo de um século não só na formação de profissionais, mas também na formação de seres humanos capazes de compreender todo o processo de desenvolvimento histórico na busca do bem-estar desta própria sociedade.

Como todas as faculdades de Direito, a nossa Faculdade de Direito da UFRGS, que nós hoje aqui homenageamos, é um centro acadêmico preparador do profissional, mas, indiscutivelmente, sempre com aquela visão de mundo, com aquela visão de sociedade assentada nos princípios fundamentais da liberdade, da democracia, da solidariedade, com as concepções que ela tem e vem mantendo do estado do direito democrático.

Toda vez, meu caro Diretor, em que se agride a ordem jurídica, atira-se uma pedra do vitrô do prédio histórico centenário da Faculdade de Direito. Não há instituição mais sensível ao processo social do que as faculdades de Direito, porque numa sociedade não há instituição sem regramento. As instituições que remontam à história primeva do homem todas possuíram os seus regramentos, e o regramento, a ordem, o direito é indissociável da vida. Não se realiza a vida sem a lei; a sociedade não se desenvolve sem a lei, sem o Direito, e a lei, que é o instrumento, o objetivo do Direito, tem, no laboratório das faculdades, no laboratório da Faculdade de Direito da UFRGS, a sua formulação. Dali saíram e continuam saindo homens que pontificaram na República nos seus mais diferentes setores, na vida pública, na vida privada, porque o arco de abrangência de visão do profissional do Direito tem exatamente esses predicados: uma visão global, mundializada das coisas, do processo, da história. O advogado, o profissional, é um homem preparadíssimo, e não é por acaso que o Ministro Aldo Fagundes chama e coloca aquela velha locução de que somos um país de bacharéis. Que bom que sejamos um país de bacharéis, porque os profissionais do Direito têm uma visão atualizada, uma concepção atualizada do mundo, assentada com base na liberdade. Não há justiça sem liberdade, não há justiça sem Direito, e o laboratório formador que prepara o homem para o exercício da liberdade do Direito são exatamente as faculdades de Direito. Poderíamos dizer que as faculdades de Direito produzem para um dos poderes do Estado, para o Judiciário. A formação de um dos poderes do Estado é constituída por profissionais do Direito.

A nossa homenageada centenária Faculdade de Direito prepara e preparou gerações para integrarem as diferentes instâncias do Judiciário brasileiro. Mas não fica aí esse papel da Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Sul. Seus integrantes ocuparam os mais diferentes setores da vida brasileira: o público e o privado. Demarcou-se pela Faculdade de Direito, pelos seus integrantes, um rumo na linha política e ideológica deste País com a Revolução de 1930. Todos os anseios da Revolução de 1930, indiscutivelmente, estiveram lá, na Faculdade de Direito, na presença dos líderes que lá estavam, tendo como seu principal líder Getúlio Vargas, e tantos outros líderes tiveram neles esse ideário. A Faculdade de Direito do Rio Grande do Sul é uma sementeira na formação de grandes lideranças.

É um acontecimento extremamente importante esse que nós hoje rememoramos e comemoramos, ou seja, os 100 anos, um século de existência fecunda da Faculdade de Direito da nossa Universidade. Poderíamos lembrar aqui tantos fatos e tantas figuras que pontificaram a Universidade, leva de professores que tiveram desempenho notável nas letras jurídicas, na política, na magistratura, enfim, tantas figuras notáveis. O que tem essa Faculdade, essa instituição magnífica, senão aqueles compromissos que radicam dos próprios anseios republicanos positivistas? Toda essa formação, toda essa carga plasmou e deu liderança ao Estado do Rio Grande do Sul, porque não se pode falar na história do Rio Grande do Sul, não se pode falar no desenvolvimento do Rio Grande do Sul, nos acontecimentos que marcaram a história gaúcha e brasileira, se não falarmos na Faculdade de Direito, se não falarmos, enfim, na UFRGS, instrumento referencial para a história e para o futuro. Já dizia o velho, querido e imortal Cirne Lima que a faculdade é o passado e o presente, porque uns vão, mesmo indo, deixam, e outros vêm. Assim se vai sucedendo a instituição dentro dos seus parâmetros, buscando as finalidades institucionais que lhe correspondem como academia formadora de homens para cumprirem seus papéis na sociedade.

Então, fica aqui a nossa homenagem, a nossa saudação, a saudação da Cidade, a saudação de seu povo pelo transcurso do centenário da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, já destacado pelo Ver. Nereu D’Avila, muito bem conduzida, séria e austeramente conduzida pelo Prof. Carrion e pelo Prof. Plínio, que deram, através das festividades que se desenvolvem há mais de ano, a dignidade que a Faculdade merecia durante uma série de palestras, conferências, debates. Hoje foi um dia todo de homenagens pelas mais diferentes instituições representativas do Estado. De hora a hora eram prestadas homenagens à Faculdade de Direito: aqui, no Tribunal de Justiça, na Assembléia Legislativa, no Governo do Estado, e por aí se vai.

Recebam os dirigentes, receba a Magnífica Reitora as homenagens, as nossas saudações pelo transcurso da data que pertence a todos nós, à Cidade, ao seu povo, porque a universidade pública é a universidade do povo, a faculdade pública é a faculdade do povo, e essa pertence ao povo. Recebam todos a homenagem da Casa neste dia memorável que marca os 100 anos, o centenário da histórica Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, a quem somos tão gratos.

Lembro, meu caro Diretor, das dificuldades. Eu estudava à noite. A minha turma, Prof. Plínio, é a turma que sai em 1967, mas que recebe o diploma em 1968. Havia uma tradição na Faculdade, porque um professor de Direito Internacional Privado, grande figura, grande lente da faculdade, era extremamente rígido e muitos alunos iam a segunda época. Então, surgiu, ao longo do tempo, a necessidade de se fazer em março a formatura. Não sei se continua assim. Deve continuar. A minha turma era uma turma extremamente rebelde, porque não tivemos paraninfo, nem quadro. Nós tentamos, mas vivíamos uma época excepcional. Nós estávamos em 1967; já se sentia o faro do AI-5, que vinha em 1968, e do 477. Convidamos para paraninfo o professor que eu quero hoje, aqui, homenagear: a figura inesquecível, hoje já com idade avançada, inclusive enfermo, do Prof. Ajadil de Lemos. Ficam aqui as nossas homenagens ao querido Prof. Ajadil de Lemos. Tinha sido cassado. Nós o convidamos para ser o nosso paraninfo. Infelizmente - não se trata de condenar a Direção da Faculdade, a Universidade, porque o sistema era esse - não foi possível ser o nosso paraninfo. Aí, tentamos Dom Hélder Câmara, Arcebispo de Olinda e Recife - pior ainda! - e não conseguimos. Então, a turma não teve quadro nem paraninfo.

Mais uma vez reiteramos, aqui, a nossa saudação e a nossa grande homenagem à histórica Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Sul. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

 O SR. PRESIDENTE: Gostaríamos de fazer um agradecimento especial para o Deputado Estadual Vieira da Cunha, representando a Assembléia Legislativa neste ato, que nos honrou com a sua presença. Saiba que V. Ex.a é sempre bem-vindo. Igualmente, agradecemos a presença do nosso sempre Vereador, Secretário Pedro Ruas, que, neste ato, representa o Sr. Governador. V. Ex.a será sempre bem-vindo a esta Casa.

Registramos, como extensão da Mesa, o Presidente do Tribunal Militar, Coronel João Vanderlan Rodrigues Vieira, e o Vice-Reitor Newton Rodrigues Paim.

O Ver. Lauro Hagemann está com a palavra em nome da Bancada do PPS.

 

O SR. LAURO HAGEMANN: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) É pertinente este local para a homenagem que se está prestando. A Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul se originou aqui em Porto Alegre e prestou inestimáveis serviços a esta Cidade, a este Estado e a este País.

Muito se falou hoje do passado desta Faculdade. Eu quero apontar para o futuro, porque no mundo em que nós nos encontramos, revolvido por conflitos novos, por novas situações sociais, por novos fenômenos sociais, é imprescindível que uma faculdade de Direito tenha competência para ordenar essa situação. É noção elementar do Direito que os fatos sociais é que devem ser regulados, e são regulados, pelo Direito.

E esta Faculdade, que por cem anos prestou os seus serviços inestimáveis a nossa sociedade, nós pretendemos que ela esteja preparada para o desafio dos novos tempos, das novas situações. Esse é o principal papel que cabe à Faculdade de Direito

A Faculdade de Direito se insere na nossa Universidade. A universidade é um ente que a sociedade aprendeu a respeitar como uma necessidade. E nós, em termos de universidade, estamos engatinhando, apesar dos nossos cem anos. Aqui na América nós temos a vetusta Universidade de São Marcos, fundada em 1553 - são quatrocentos e quarenta e sete anos de universidade -, e nós estamos comemorando apenas os primeiros cem anos da nossa. Temos um longo caminho a percorrer. Queiram os fados que sejamos ajudados pela compreensão da sociedade no prolongamento dessa história.

Em meu nome pessoal, que pertenço à Universidade há muito tempo, em nome do meu Partido Popular Socialista - tivemos grandes nomes que por lá passaram, dirigentes do antigo Partido Comunista -, desejo à Universidade, ao Prof. Carrion, ao Prof. Plínio, o melhor sucesso nesta empreitada e que as festividades do centenário se coroem do mais brilhante êxito. Parabéns e muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. Isaac Ainhorn está com a palavra em nome do PDT.

 

O SR. ISAAC AINHORN: Sr. Presidente, Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Parodiando o filósofo espanhol Ortega y Gasset, que diz que “a clareza é a cortesia dos filósofos”, diria que a brevidade será a cortesia do político.

Agradeço ao autor e proponente desta Sessão, meu colega de bancada, Ver. Nereu D’Avila, a oportunidade para que dois vereadores da Bancada do PDT pudessem fazer uso da palavra, até porque nós, trabalhistas, temos uma enorme tradição naquela Casa: Getúlio Vargas, Alberto Pasqualini, João Goulart, Francisco Brochado da Rocha, Oswaldo Aranha. É uma trajetória de presenças, assim como de tantas outras matizes políticas, que revelam a natureza plural daquela Casa.

Por outro lado, quero manifestar a minha satisfação como vereador, ainda emocionado. Quando hoje, pela manhã, às 8h30min, ouvíamos o badalar do sino da nossa Faculdade, eu evocava, Sr.a Reitora, Prof. Plínio, Prof. Noronha, um sentimento de saudosismo daqueles anos que vivemos lá e do momento em que entrei naquela casa. Naquela oportunidade, Prof. Mainar, só havia duas faculdades de Direito. Não era essa loucura desenfreada, esse negócio que não dá para entender, esse número de faculdades que existem - sem nenhum preconceito à PUC, até porque hoje eu tenho um filho que cursa a Faculdade de Direito lá, e a minha esposa. Naquela época, eu só podia ingressar na Faculdade de Direito da Universidade Federal. Eu me lembro da figura do Prof. Elpídio Ferreira Paes lá na frente, coordenando o vestibular, diferente do que é hoje. Se eu não passasse no vestibular da UFRGS, no início de 1964 e início de 1965, teria que esperar um ano, porque eu não tinha condições econômicas para ir a uma faculdade que também nascia - inclusive nós comemoramos aqui o seu cinqüentenário há pouco tempo. Então, havia essa natureza democrática, pública, universal da nossa Universidade Federal. Infelizmente, hoje, eu constato que o ensino universitário, em vez de proporcionar uma abertura maior para que as pessoas possam chegar a uma universidade pública, ao contrário, vêm-se afunilando as possibilidades de acesso à universidade pública e a possibilidade do estudo acadêmico, podendo-se concluir o curso propriamente dito através de uma universidade pública sólida, preparada. Por que não uma universidade privada, onde o Poder Público colocasse à disposição daqueles que precisam as bolsas necessárias para se concluir o terceiro grau? Essa é a lembrança.

Houve alguns momentos difíceis pelos quais passei, sim. Vivi momentos de um período autoritário de vida no nosso País. Eu entrei em 1965 e saí em 1969. Foi um período duro, difícil, de expurgo de alguns professores, que o meu colega Elói Guimarães falou, como da extraordinária figura de Ajadil de Lemos. Recordo também de outro professor que teve que sair expurgado da Universidade, naquele momento, da Faculdade do Direito: Prof. Brasil Barbosa. E um aluno chegou a ser expulso da Faculdade por questões políticas. Um aluno, naquele momento difícil, quando, depois que nós invadimos o restaurante universitário, o Conselho Universitário tristemente se reuniu e o expulsou, mas o titular de Direito Penal daquela Faculdade permitiu que aquele aluno entrasse na sua sala de aula e o Prof. Luiz Lopes Palmeira - recordo - disse: “Aqui o senhor é permanentemente aluno desta Casa e desta Faculdade.” Ele já expulso, Prof. Luiz Lopes Palmeira, de um outro pensamento político, permitiu que o então acadêmico Carlos Alberto Vieira fizesse as suas despedidas. Recordo-me que foi concluir o seu curso de Direito na Universidade de Passo Fundo, por ajuda - tomei conhecimento deste fato bem mais tarde - do Vereador e Coronel Pedro Américo Leal, que era um partícipe daquele momento difícil, do outro lado da trincheira, mas por quem tenho o maior respeito porque sempre foi um homem digno, íntegro e cumpridor de sua palavra.

São os registros da falta de um governador de Estado, porque, a rigor, a Faculdade de Direito não teria cinco governadores de Estado, teria seis. Cassaram alguns deputados estaduais para não permitir que Ruy Cirne Lima fosse governador do Estado do Rio Grande do Sul. Isso aconteceu. São fatos que registram a história da nossa Faculdade, os subterrâneos daquela casa. O Serviço de Assistência Judiciária, referido pelo Ver. Décio Schauren, o Grêmio Literário Tobias Barreto e o Centro Acadêmico André da Rocha são algumas lembranças que aqui, neste momento, fazemos em registros fundamentais por ocasião, para mim, de duas casas de que esta Casa e este Vereador, na sua condição pessoal, estão comemorando o centenário, e duas casas que têm uma aproximação, filhas do positivismo comteano: o Colégio Estadual Júlio de Castilhos e a Faculdade de Direito de Porto Alegre.

Recordo-me de momentos maravilhosos, das aulas extraordinárias da década de 60, das lições de Economia de Jorge Ribas Santos, das lições de Teoria Geral de Direito, fundamentais para nossa formação, de João Leitão de Abreu, do Jus naturalismo, daquela extraordinária figura de Armando Câmara, dentre tantos outros professores que poderíamos citar na plêiade de figuras extraordinárias da vida jurídica e da vida política de nosso País. Aliás, temos essas duas vertentes: a jurídica e a política. A política forjou personalidades extraordinárias como aqui referimos, de Getúlio, de Jango, de Pasqualini e de outros, com outros pensamentos, como Leitão de Abreu, Mem de Sá e outras figuras, e a vertente jurídica deu contribuições extraordinárias às letras jurídicas nacionais e aos nossos tribunais estaduais e federais.

Encerro e registro a satisfação desta também bicentenária Casa que tem mais de duzentos anos, o Legislativo Municipal, que nesta oportunidade faz o seu reconhecimento e presta a sua homenagem à Faculdade de Direito de Porto Alegre. Muito obrigado. (Palmas.)

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Dando seqüência a este ato, nós gostaríamos de fazer o registro de que a nossa querida Reitora, Dra. Wrana Panizzi, por compromisso na Universidade - uma formatura -, terá que se retirar neste momento da nossa Sessão, razão pela qual esta Presidência, em nome da Câmara Municipal de Porto Alegre, agradece sua presença e convoca o nosso querido Vice-Reitor, Doutor Newton Rodrigues Paim, para substituí-la, bem como representá-la no pronunciamento de encerramento desta Sessão.

O Ver. Pedro Américo Leal está com a palavra pela Bancada do PPB.

 

O SR. PEDRO AMÉRICO LEAL: Sr. Presidente e Srs. Vereadores, demais autoridades, passei à frente dos meus colegas de bancada João Dib e João Carlos Nedel, impondo-me como orador desta Sessão. O silêncio deles, postulantes, também, da honraria em saudar a Faculdade de Direito da UFRGS, foi significativo. O silêncio e nada mais. E que argumentos apresentei? Sou bacharel, sou advogado? Não. Sou gaúcho? Também não. Sou o melhor orador? Há controvérsias! Detive a impetuosidade de um e a persistência do outro com as seguintes razões: meus quatro filhos são advogados. Exercem. Um genro advogado. Exerce. Dois netos advogados. Exercem. Dois netos em formação. Estagiam. Apoiei meus filhos que estudavam em princípio democrático. Baixei um decreto: “Tirem a faculdade que quiserem, mas tirem Direito também. Eu pago!” E aqui está uma das minhas filhas que é testemunha disso. A segunda opção vigorou. O efetivo demonstra isso. Pois esperar resposta dos dois colegas, que eu interpelei, foi desnecessário. E eu estou aqui para saudá-los neste 17 de fevereiro.

A partir das 17h, a Comissão Honorífica da Faculdade de Direito saiu do edifício-sede e foi às ruas para receber justas e merecidas homenagens, ela que em seu ventre abrigou, alimentou intelectualmente figuras notáveis deste Estado e deste País: presidentes da República, ministros de Estado, governadores, senadores, deputados, vereadores, inúmeros empresários. Mais de seis mil formandos ela diplomou! Eu sou um frustrado por não ter tirado Direito! Todo o Plenário sabe. Eu sempre apregôo isso! Na área jurídica, diplomou seis ministros do Supremo Tribunal Federal. Como pano de fundo e fundo musical, como ex-aluno e servidor da Faculdade, ela deu um toque popular, apresentando a figura inesquecível de Lupicínio Rodrigues.

Mas, no linguajar jurídico, eu tenho prazos: a campainha do Presidente, que até agora não se manifestou, silenciosamente me observa. Não devo me afastar do principal: saudar a Faculdade na pessoa do Diretor Dr. Eduardo Kroeff Machado Carrion, neto do primeiro aluno matriculado nesta Faculdade e da família do meu amigo, querido e inesquecível Cândido Carrion. V. Ex.a sabe o quanto eu queria bem   esse homem. V. Ex.a, Dr. Carrion, estabeleceu sabiamente objetivos e parâmetros na caminhada ao longo deste milênio dominado pela informática. Tradição e modernidade é o que prega V. Ex.a. Entendo-o como pensador interessado e zeloso das coisas que estão por acontecer. Com o pé no futuro, ainda moço, hesita em abandonar o pé que repousa no passado. Pois veja, Dr. Carrion, o importante da herança recebida: tradição, o passado. Eu dou muito importância a isso.

O arquiteto e o engenheiro da obra, magnífico edifício, de sua Faculdade eram alemães e foram buscar no palácio do Kaiser as fontes de suas inspirações. Concluíram a obra em 1910, mas a pá do pedreiro que trabalhou no lançamento da pedra fundamental em 1908 está guardada, como relíquia, em sua Faculdade.

A Ordem Sagrada do Sino, a profana, praticou uma apropriação indébita - permitam-me os ilustres bacharéis, advogados, perdoem-me os homens da lei -, quando escondeu um célebre sino. Foi um roubo romântico, realizado pela turma de 68, se não me engano, do Ministro Jobim, já prescrito na memória sagrada dos que terminaram a Faculdade ou que venham a terminá-la através dos tempos. Que beleza esse roubo do sino! Temos que dar valor a isso e não buscar o sino, em substituição ao objeto desaparecido e que todo o mundo sabe onde se encontra. O velho sino, o primitivo, hoje em dia está badalando, anunciando agora os grandes eventos em substituição ao novo. Parece incrível! Sino e coração têm muitas afinidades a ponto de um poeta referir-se numa magnífica estrofe: “Sino, coração da aldeia. Coração, sino da gente. Um a sentir quando bate. Outro a bater quando sente.” O sino é uma coisa fenomenal nessa história toda da Faculdade. Não busquem o sino, por favor! Deixem-no lá! Os réus têm domicílio certo, têm profissão, estão identificados. Tudo não passa de uma traquinada. Eles erguem e fazem a mística da Faculdade, como o Dia do Pendura, que vai desaparecendo e com ele a jovialidade da juventude estudiosa. Eu não sei se não lamento que o Dia do Pendura desapareça; e está desaparecendo. Tudo isso constrói, tudo isso é tradição, como a saudade que vai caminhando inexoravelmente em direção à velhice e que V. Ex.as já devem estar sentindo, onde, melancolicamente, vamo-nos encontrar com as tradições mais eloqüentes e, cheios de saudades, vamo-nos lembrar de tudo isso que compôs a nossa juventude romântica de alunos de faculdade.

Eu cursei três faculdades, não cursei Direito, e me arrependo. Não cursei por culpa da Escola de Polícia, onde ministrava aulas à noite.

Dr. Carrion, o rumo está certo. As tradições devem estar vivas, jamais mortas, mesmo a custo e com o sacrifício de perfeições ultrapassadas. É o caso do sino. Não busquem o sino! Deixem-no por lá onde está badalando! Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Ver. Reginaldo Pujol está com a palavra e falará pela Bancada do PFL.

 

O SR. REGINALDO PUJOL: Sr. Presidente, ao saudar o ilustre Dr. Eduardo Carrion, Diretor da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, eu peço vênia aos nossos demais convidados para saudá-los, já que todos têm algo em comum com a figura do Diretor da nossa Faculdade que hoje vê a sociedade gaúcha festejar o seu centenário.

Quero, com toda a sinceridade, enfatizar uma preocupação que, no momento, se apossa de mim. Sou o sétimo orador numa solenidade em que o brilho dos meus antecessores fica definitivamente consagrado não só nos Anais da Casa, mas agora, mercê da tecnologia, gravado, de forma a perenizar na história o sentimento dos porto-alegrenses aqui representados com relação à Faculdade de Direito, que compõe a história do Rio Grande, como já foi amplamente aqui acentuado. Essa ousadia, Srs. Vereadores, é bem mais ampla na medida em que, sendo eu oriundo da Pontifícia Universidade Católica, onde me formei em Direito no ano de 1969, entrevero-me, ousadamente, com aqueles outros colegas, todos eles com passagem pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, quando não diretamente com a Faculdade de Direito da UFRGS, cujo centenário hoje se comemora. De qualquer sorte, a ousadia, para quem é o único liberal desta Casa, não deve ser desconforto, de modo algum. Pelo contrário, sinto-me confortável em não ser egresso da faculdade homenageada e devo assinalar, no dia de hoje, a importância, o significado e o valor que tem essa instituição de ensino com a cultura, com a educação e, sobretudo, com a formação política do nosso Estado. Não precisava mais do que repetir as veementes palavras que aqui foram ditas para que esta colocação fosse por inteiro comprovada. Ninguém perdura cem anos num país onde as mutações políticas são cíclicas. Ninguém enfrenta os vários períodos de reorganização política neste País da forma sobranceira com que a Faculdade enfrentou, sobreviveu e se impôs se não tivesse, nos seus alicerces, uma vocação, uma predestinação histórica que só o tempo consegue confirmar.

Por isso, de coração e com o respeito que deve caracterizar a admiração e a consideração, quero dizer aos dirigentes de hoje da Faculdade de Direito da Universidade do Rio Grande do Sul que falaram sobre a importância dos vultos que ali passaram: bastaria tão-somente reler o que os jornais nos últimos dias acentuam. Bastaria, por exemplo, que se relesse a relação de seus diretores desde Carlos Thompson Flores até Eduardo Kroeff Machado Carrion, para que ali nós fôssemos encontrar nomes do porte de Manoel André da Rocha, de Edgar Luiz Schneider, de Elpídio Ferreira Paes, de Luiz Mello Guimarães, de Elói José da Rocha, de José Salgado Martins, que por mais de uma vez dirigiu a Faculdade, de Galeno Vellinho de Lacerda, de Ruy Cirne Lima, de Fernando Jorge Schneider, de Clóvis do Couto e Silva, de Almiro do Couto e Silva, de José Sperb Sanseverino e de Peter Walter Ashton. Isso, por si só, diria o que é a nossa homenageada. Nada mais precisaria ser dito. Aliás, eu vejo que até mesmo os nossos articulistas buscam das mais diversas formas encontrar facetas específicas da homenageada para a realçar.

Ainda hoje, o Jornalista Lauro Schirmer se refere ao teatro de idéias, o que me faz buscar o único mote que me resta neste pronunciamento. Nos tempos acadêmicos, o meu colega, hoje Senador da República, José Alberto Fogaça de Medeiros, ao preparar uma tese em um simpósio da Reforma Universitária, eu vi meu colega cunhar uma frase que julguei insubstituível. Dizia ele, na época, que a universidade, falando no conjunto, era o laboratório das idéias sociais do seu tempo. Hoje, lendo o que Lauro Schirmer colocou em Zero Hora, referindo-se à peça produzida por Germano Bonow Filho, por Huet Bacelar e Sílvio Bonow e que intitularam A Construção do Rei, e vendo ele simbolizar na expressão “teatro de idéias”, convenço-me de que a frase cunhada pelo meu colega de bancos acadêmicos pôde ser mais sintetizada: é, indiscutivelmente, um teatro de idéias aquela Faculdade, onde a encenação é feita com o coração, entusiasmo e, sobretudo, com a consciência de que um centro de cultura jurídica não é uma mera casa de ensino: é uma escola de cidadania, onde todos nós entendemos que fora do Direito e fora da lei não há salvação.

A nossa Faculdade, a sua Faculdade, tem sido inexcedível nesse trabalho. As nossas homenagens. Muito obrigado.

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Neste momento, temos a honra de passar a palavra ao Sr. Eduardo Kroeff Machado Carrion.

 

O SR. EDUARDO KROEFF MACHADO CARRION: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Saúdo também a Profa. Isolda Paes, viúva do nosso grande Prof. Elpídio Paes, de quem tive a honra e a sabedoria de ser aluno. Fui aluno também da Profa. Isolda no amado e estimado Colégio de Aplicação, com quem aprendi Português e Literatura Brasileira.

Agradeço a todos os vereadores que se pronunciaram por suas bancadas, especialmente ao Ver. Pedro Américo Leal, que tem uma ligação muito forte com a Faculdade de Direito. Estamos sempre lhe esperando, mas seu filho é nosso colega, é nosso colaborador como professor. Pela Bancada do PTB, Ver. Elói Guimarães. Um agradecimento especial da Faculdade de Direito ao Ver. Nereu D’Avila que, como Presidente da Câmara Municipal de Porto Alegre, possibilitou esta homenagem. Fazemos, também, um agradecimento especial aos Vereadores Isaac Ainhorn e Elói Guimarães, dois egressos de nossa escola e que foram duas importantes peças na realização desta Sessão em homenagem à nossa Faculdade.

Vou deixar de lado o texto que tinha preparado, porque fiquei emocionado com o que foi dito e muito aprendi durante esta jornada. Aprendi algo que, talvez, em uma circunstância normal, não teria aprendido em dez anos. Em face da grandiosidade de nossa escola, o dia 17 começou no dia 16, numa reunião do Conselho Seccional da Ordem dos Advogados. Desde ontem, em torno das 18h, aprendi o que não aprenderia, talvez, em circunstância de normalidade, em dez anos. Nunca imaginei que esta instituição centenária tivesse esse carinho da sociedade porto-alegrense e da sociedade gaúcha. O apoio, as homenagens, a repercussão refletem a semente que nós conseguimos plantar.

Gostaria de agradecer esta homenagem nesta Sessão da Câmara de Vereadores, na medida que a Câmara de Vereadores representa a diversidade de nossa sociedade, lembrando um episódio que para nós foi decisivo.

A Faculdade de Direito era localizada no velho prédio da Escola do Liceu, situada na confluência da Rua Duque de Caxias com a Rua Marechal Floriano, a Rua do Bragança. Pois bem: nessa empreitada da construção da Casa de André da Rocha, um terreno nos foi cedido pelo Município de Porto Alegre. Foi uma decisão que conjugou o esforço da representação popular e o esforço da Intendência Municipal. Era intendente, na ocasião, a quem eu presto simbolicamente homenagem, em nome da Faculdade de Direito, o Dr. José Montaury de Aguiar Leitão.

Essas são as homenagens de agradecimento da Faculdade de Direito a essa contribuição do Município de Porto Alegre para que a Faculdade de Direito fosse hoje o que ela é, porque ela é mais do que aquele prédio, que é uma estrutura física. Ela simboliza a cultura jurídica do Rio Grande do Sul, simboliza, em grande parte, o espírito republicano do Rio Grande do Sul. E os senhores nos ajudaram a construir esse símbolo, sim. E nós formamos, em grande parte ou decisivamente, a geração que empolgou o poder do Estado nos anos 30 e transformou este País. Dependeu basicamente dessas personalidades. Mas as suas potencialidades frutificaram, foram exacerbadas nesse convívio passageiro, mas permanente, na Faculdade de Direito.

Nós encontramos nos arquivos da Faculdade de Direito, mais especificamente na pasta de Getúlio Vargas, uma prova de Filosofia do Direito realizada em 1906, que antecipa, praticamente, toda a visão do Estado implementada a partir dos anos 30, um Estado preservando a propriedade privada, mas intervindo com políticas compensatórias para possibilitar a emancipação dos desfavorecidos - o que nós chamamos hoje, em linguagem atual ou pós-moderna, o resgate da cidadania. Isso está numa prova de Filosofia do Direito de Getúlio Vargas. Isso não é gratuito. Esse era o debate que ocorria na Faculdade de Direito: tradição e modernidade, Ver. Pedro Américo Leal.

Eu não vou me referir a esses grandes exponenciais, a essas grandes figuras que ilustram a Faculdade de Direito, a esse sem-número de juristas e políticos. Como já foi dito, foram cinco governadores de Estado - deveriam ser seis, a rigor -, seis ministros do Supremo Tribunal Federal, sem contar os professores que foram ministros do Supremo Tribunal Federal sem terem sido alunos, apenas egressos da Faculdade de Direito, porque houve inúmeros professores, até meados deste século, que foram ministros do Supremo sem terem sido alunos; parlamentares, prefeitos, ministros de Estado, ministros de Tribunais Superiores, desembargadores, presidentes de Tribunais, empresários. Não vou me referir a esses, porque todos nós conhecemos essa história. Vou-me referir a uma história que, em sendo menor, é maior, uma atividade que, em sendo pequena, é grande, uma atividade que, em que sendo cotidiana, é permanente.

A Faculdade não só ajudou a construir um espírito republicano no Estado e no País, mas foi um instrumento da construção do estado de direito no Rio Grande do Sul. Esse foi um trabalho cotidiano que não é deste ou daquele: é de todos, de muitos e de ninguém. Um trabalho permanente, conseqüente, num Estado permeado de disputas, de guerras, desde o século passado. Nós ajudamos a construir o estado de direito, a localizar a disputa e a diferença necessária, numa sociedade democrática, no leito da ordem jurídica, no parâmetro da regra jurídica. Essa foi a nossa grande contribuição, uma contribuição sem conta, a par dessas grandes personalidade já referidas, esse trânsito do Estado para uma disputa política, civilizada, que superasse a guerra, em que a política fosse a transcendência da guerra, a transcendência no sentido da superação e da sublimação da guerra. Talvez não tenhamos de todo nos liberado dessas raízes, mas, seguramente, ajudamos neste trânsito, ou estamos ajudando. Somado a isso, ou estruturalmente ligado a isso, o espírito de tolerância, necessário na democracia, que não afasta a diferença, que não afasta a diversidade, mas possibilita a diferença e a diversidade, a tolerância necessária na sociedade democrática. Isso se expressa no alvorecer da nossa instituição.

Todos os senhores sabem da importância que foi a experiência positivista no Estado do Rio Grande do Sul. Foi a nossa forma de transitarmos para a modernidade, uma visão republicana, no sentido legítimo da res publica, em face daquela herança oligárquica, mas uma visão de estado tutelar. Poder-se-ia dizer, em linguagem contemporânea, autoritária, subordinação do Legislativo, predominância do Executivo. Foi a nossa forma, talvez precária, limitada, mas foi a nossa forma de transitarmos para a modernidade; em linguagem sociológica, a chamada modernização conservadora. Os cursos superiores surgem no Rio Grande do Sul em grande parte como decorrência do descortino desta elite política e cultural, sob segura influência do positivismo, de marca comteana. A nossa Faculdade não fugiu à regra. Houve o importante incentivo e estímulo do patriarca da República Júlio de Castilhos e do governador de então, Antônio Augusto Borges de Medeiros.

Pois bem: em que pese essa influência predominante, a primeira aula da Faculdade de Direito, em 4 de maio, pronunciada por Plínio Casado, foi uma aula de defesa do estado de direito e da supremacia do Legislativo sobre o Executivo. Ele é um crítico do positivismo. Vejam que clima de liberdade, de contraditório e de diversidade: um jovem professor, nos seus vinte e poucos anos, agraciado com esta honra de pronunciar a aula inaugural da Faculdade de Direito, criticando a visão positivista de Estado, uma instituição que surge sob o impulso do positivismo. Convivemos, durante anos, com a disputa entre os positivistas de marca comteana e os naturalistas de influência neotomista, uma disputa acirrada intelectual, mas em que não afastava a convivência humana e a cortesia.

Nesse sentido, nós nos transformamos no templo da cidadania e da tolerância. Houve momentos de intolerância e nós temos que assumir criticamente. Eu me referi a um momento de intolerância da nossa instituição, embora nós tenhamos, com relação à intolerância, sobretudo, sido vítimas, como já foi referido. Em 64, tivemos dois professores expurgados. Nós somos, sobretudo, vítimas, mas nós somos, circunstancialmente, agentes da intolerância e assumimos criticamente isso. A turma que não teve a sua festa de formatura porque foi impedido que o paraninfo escolhido comparecesse à Faculdade.

Mas a trajetória que marca a nossa instituição é uma trajetória da construção do estado de direito, da diversidade, da discussão e da tolerância. Isso se expressa nesse episódio que relatei aos senhores e se expressa num outro episódio mais recente, e, num certo sentido, dou uma resposta ao Ver. Pedro Américo Leal sobre o episódio do sino. Sim, uma brincadeira de juventude, que não tem o aval oficial da instituição. Não, não foi furtado o sino! Ele foi tomado emprestado, e essa nuance de linguagem já expressa a tolerância da casa, tolerância que se somou em inúmeras gestões. O episódio ocorreu na gestão do Prof. Galeno Vellinho de Lacerda, episódio que foi tolerado pelas gestões seguintes. Quando nós assumimos, o fato já estava consumado. É o que eu tenho dito: não cabe mais medida judicial; se coubesse, se não tivesse havido a prescrição, nós tomaríamos, seguramente, medida judicial. Esse é o discurso que se faz, mas sabemos que nenhuma medida seria tomada. Estamos fazendo gestões para que eventualmente seja devolvido. É um episódio que até engrandece a nossa história, mas a Direção tem que dar uma resposta. Então, recuperamos para a sociedade gaúcha aquele que foi o primeiro sino: o sino dos nossos fundadores. Ele já simboliza a nossa proposta: tradição e modernidade. Trouxemos um símbolo do passado, mas completamente restaurado e modernizado.

Mas a história volta ao seu começo. Quando se fala “tradição e modernidade”, isso não é algo novo. Isso faz parte da nossa tradição. A própria modernidade é a nossa tradição. Sim, aí nós recuperamos o verdadeiro símbolo da Faculdade, a nossa logomarca oficial, segundo decisão do ano passado da Egrégia Congregação da Faculdade de Direito. Recuperamos, pesquisando nos nossos arquivos, o símbolo da Faculdade - o primeiro registro é de 1908: um trapézio, que é um triângulo inconcluso simbolizando essa idéia de uma obra não concluída ainda, uma tarefa a realizar-se, uma abertura para o futuro e uma Justiça sem os olhos vendados, algo revolucionário na época, quando tradicionalmente a Justiça era simbolizada com os olhos vendados. É verdade que na antiga Grécia a deusa Têmis ora era representada com os olhos vendados, ora não. E a Justiça da Corte Internacional de Haia, da Organização das Nações Unidas, é representada sem os olhos vendados. Não aprofundamos a nossa pesquisa, mas presume-se que a nossa representação de Justiça se antecipa à representação da Justiça sem os olhos vendados, da Corte Internacional de Haia. Que bela expressão de modernidade! Isto é: uma Justiça atenta às angústias do presente, com os olhos abertos para as preocupações do homem comum.

Hoje, quando se fala em hipossuficiência, há o reconhecimento das desigualdades materiais, que uma simples norma jurídica de igualdade cristaliza as desigualdades materiais. Daí a necessidade de que muitas vezes a norma jurídica seja desigual para amparar o desigual. Para restabelecer uma igualdade de fato, temos que estabelecer uma norma desigual, muitas vezes. É o que se chama de Direito Social, no sentido genérico, anunciado pelo Direito do Trabalho. Hoje, fala-se, por exemplo, em direito do consumidor, em direito dos usuários de serviços públicos, que procuram, através de uma regra de desigualdade, resgatar o mínimo de igualdade material. Ora, para chegarmos a tanto, a Justiça tem que estar com os olhos abertos. Para reconhecer a desigualdade material, ela não pode estar com os olhos vendados, porque senão ela observará apenas a norma etérea, aparentemente imparcial. Não. O trabalho do magistrado, o trabalho do mediador jurídico, do doutrinador precisa resgatar da realidade esses aspectos de diversidade para que a regra abstrata se concretize de uma forma justa.

Desde o início do século, nós procurávamos conjugar tradição e modernidade. A gestão do centenário, ao enfatizar, ao insistir, ao exacerbar este dístico “tradição e modernidade”, apenas procurou reforçar a sua tradição e, em reforçando a sua tradição, reforçar a modernidade. Muito obrigado. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: O Sr. Newton Rodrigues Paim, Vice-Reitor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, está com a palavra, representando a Magnífica Reitora Dra. Wrana Panizzi.

 

O SR NEWTON RODRIGUES PAIM: Sr. Presidente e Srs. Vereadores. (Saúda os componentes da Mesa e demais presentes.) Cabe-me, neste momento, com muita honra e alegria, representando a Magnífica Reitora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, agradecer a homenagem que esta Casa presta a nossa centenária Faculdade de Direito, agradecer aos Srs. Vereadores pelos seus pronunciamentos e pelos relatos que muito esclareceram sobre a história da Faculdade de Direito e da nossa Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

No dia de hoje, o quarto pilar que compõe a estrutura originária da Universidade Federal do Rio Grande do Sul completa cem anos. A mais antiga é a Escola de Farmácia e Partos em Porto Alegre, seguida pela Escola de Engenharia, que deu origem à primeira denominação de Universidade no Brasil: a Universidade Técnica de Porto Alegre. Na seqüência, a Faculdade de Medicina, juntamente com o Curso de Odontologia, que era agregado à Faculdade de Medicina, e agora a nossa Faculdade de Direito. A partir dessa estrutura básica, estamos com cinqüenta e nove cursos de graduação, quase uma centena de cursos de pós-graduação, uma atividade muito intensa de pesquisa e de extensão. Portanto, além dessa história centenária, posso afirmar aos senhores que a Universidade Federal do Rio Grande do Sul está preparada para os próximos séculos, tendo em vista que a instituição universitária no mundo inteiro é uma das mais perenes na história da humanidade, e a Universidade Federal do Rio Grande do Sul está preparada para o desafio dos próximos séculos.

Muito obrigado a todos, muito obrigado a esta Casa por esta homenagem. (Palmas.)

 

(Não revisto pelo orador.)

 

O SR. PRESIDENTE: Agradecemos a presença de todos, ilustres autoridades e representantes de autoridades.

Convidamos todos os presentes para, em pé, ouvirmos o Hino Rio-Grandense.

(Executa-se o Hino Rio-Grandense.)

 

Estão encerrados os trabalhos da presente Sessão.

 

(Encerra-se a Sessão às 19h35min.)

 

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